Pesquisadores da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da University of Virginia
School of Medicine, dos EUA, descobriram os estágios iniciais da doença de
Parkinson. O estudo com a conclusão foi publicado no jornal Communications
Biology.
A
pesquisa demorou três anos para ser concluÃda. A próxima etapa será o
rastreamento de drogas que bloqueiem os oligômeros (estrutura proteica em forma
de cadeia com baixo peso molecular), antes de partir para a segunda fase de
testes em animais e seguir para os testes finais em humanos.
Parkinson
é a segunda mais comum das doenças neurodegenerativas e pode levar à demência.
A primeira é o Alzheimer.
Destruição progressiva
Doenças
neurodegenerativas são doenças em que ocorre a destruição progressiva e
irreversÃvel de neurônios, as células responsáveis pelas funções do sistema
nervoso. Quando isso acontece, dependendo da doença, gradativamente o paciente
perde suas funções motoras, fisiológicas e/ou sua capacidade cognitiva.
“A grande
questão é saber qual é o alvo para poder desenvolver uma terapia, um
medicamento. O nosso trabalho mostra, exatamente, a formação dos chamados
oligômeros competentesâ€, disse um dos autores do trabalho o pesquisador pela
UFRJ, Jerson Lima Silva. “Tem evidências que [os oligômeros] seriam o nosso
melhor alvoâ€. De acordo com o pesquisador, o Mal de Parkinson afeta mais de 5
milhões de pessoas no mundo.
Essas
estruturas proteicas, quando se rompem, fazem a célula morrer e, na maioria das
vezes, quando o paciente é diagnosticado com sintomas clÃnicos, na realidade o
Mal de Parkinson começou muito antes. “O tratamento é paliativo. Não há
tratamento que cure ou atenue a doençaâ€, disse Silva, que é médico e professor
do Instituto de BioquÃmica Médica da UFRJ.
O estudo
permitiu que os cientistas observassem, pela primeira vez, como diferentes
variantes da alfa-sinucleÃna, proteÃna associada ao Mal de Parkinson, interagem
ao longo do tempo, formando inicialmente esses oligômeros. A partir disso, e
usando a forma familiar, com mutação, eles conseguiram identificar a formação
inicial de agregados da proteÃna ligados aos casos precoces da doença.
Doença ao
longo da vida
O
professor da UFRJ e doutorando na Universidade de Virginia, Guilherme de
Oliveira, também coautor do estudo, disse que uma pessoa desenvolve Parkinson
ao longo de toda a vida. “A conversão entre os estágios da proteÃna acontece
lentamente e as estruturas intermediárias e os filamentos se acumulam por muito
tempo. Não sabemos qual dos dois desencadeia o surgimento dos sintomas e é mais
tóxico para as célulasâ€, disse. Oliveira disse que, se os pesquisadores
conseguirem entender o inÃcio da conversão, poderiam desenvolver uma terapia
para o tratamento precoce da doença.
Silva
acrescentou que o desenvolvimento da doença é um processo lento e que os
sintomas, em geral, costumam atingir pessoas com mais idade. “Por isso a forma
não familiar é comum depois dos 65 ou 70 anos de idadeâ€. Segundo o cientista da
UFRJ, os tratamentos paliativos não cessam o processo de formação de oligômeros
que geram mais agregados, passando de célula para célula. “É isso que a gente
tem que buscar debelarâ€.
Técnicas
de ponta
Os pesquisadores
usaram técnicas de ponta em microscopia eletrônica de alta resolução que
permite ver a nÃvel atômico as proteÃnas desagregadas. “É importante entender
qual é o alvo e o que deve ser utilizado, tanto para desenvolver medicamentos,
quanto para, talvez, desenvolver métodos diagnósticosâ€, disse Silva. O estudo
utiliza as proteÃnas retiradas das células e avalia seu comportamento. Os
pesquisadores puderam ver que o produto final tinha diferença, dependendo da
mutação. Silva estima que o projeto deverá se estender por dois ou três anos.
Os
pesquisadores compararam a formação das estruturas em quatro variantes da
alfa-sinucleÃna, das quais três estavam ligadas a casos hereditários precoces
da doença e uma se achava presente nos casos de envelhecimento, que não tem
mutação. Com isso, descobriram que nos casos de Parkinson precoce, os estágios
intermediários dos processos de agregação de cada variante da proteÃna se
formavam em uma velocidade maior do que nos casos de envelhecimento. Isso pode
explicar o surgimento de sintomas em pessoas mais jovens.
Eles
detectaram também que os filamentos amiloides mostraram estruturas distintas,
dependendo da variante da proteÃna da qual se originam. Além de perceber que os
estágios iniciais da conversão são distintos, notaram que alguns filamentos
formados nos casos de Parkinson precoce também são diferentes.
Fluorescência
Utilizando
a técnica de fluorescência, os pesquisadores não só visualizaram as diversas
etapas de associação da proteÃna ao longo do tempo, mas observaram também
estruturas que antes não eram percebidas. Ao usarem a técnica da
criomicroscopia eletrônica, que deu a seus criadores o Prêmio Nobel de QuÃmica
em 2017, os pesquisadores observaram a organização estrutural dos filamentos
amiloides.
“Como
elas [proteÃnas] são muito sutis, não era muito clara a separação entre o que é
estrutura competente e não competente para gerar fibraâ€, disse Silva. Oliveira
acredita que ao enxergar tais estruturas, os cientistas poderão contribuir para
o desenvolvimento de novos tratamentos contra a doença.
O estudo
teve apoio da Pew Charitable Trusts, organização não governamental sem fins
lucrativos, que estimula a filantropia na população carente dos Estados Unidos,
e foi financiado também pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa
do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento
CientÃfico e Tecnológico (CNPq) e pelo Instituto Nacional de Ciência e
Tecnologia em Biologia Estrutural e Bioimagem (Inbeb).