RIO— Reservar um tempo do dia para deixar a mente quieta
e livre das tensões e olhar para dentro de si mesmo com muita atenção. À
primeira vista, a meditação pode parecer algo difícil em um mundo cada vez mais
tecnológico e que impõe pressa e preocupações à mente. Professores da área,
entretanto, apontam um aumento significativo da procura pela técnica milenar,
que apresenta tipos diversos de execução.
Na Zona Sul, estúdios oferecem a meditação tanto em atividades
em grupo (com dinâmicas, dança e vibrações) quanto individuais, que podem ser
feitas até na sala de espera de um consultório médico. Além dos benefícios à
saúde, como diminuição do estresse e das dores, especialistas apontam que o
relaxamento profundo e a queda da excitação mental proporcionados pela
meditação trazem aspectos positivos à vida prática, como o aumento da
criatividade, da produtividade e da memória.
Diretor da Sociedade Internacional de Meditação no Rio,
Klebér Tani dá aulas de meditação transcendental (MT) na sede da instituição,
no Leblon, e explica a prática e seus resultados:
— Essa técnica tem efeitos que se estendem no nível
mental em função do processo de interiorização que a pessoa experimenta quando
medita. Ela percebe, durante esse mergulho, o lugar onde os pensamentos nascem.
Então ela é capaz de filtrá-los melhor. Como consequência disso, temos um
aumento de memória, de concentração e pensamentos mais ordenados — aponta Tani.
O professor explica a eficácia da meditação transcendental
no tratamento de doenças:
— Como a maioria das doenças é psicossomática e,
portanto, tem um fundo nervoso, com níveis de cansaço e tensão muito altos, no
momento em que esse cansaço é eliminado, a incidência dessas doenças cai.
Presente em escolas, empresas e até na Polícia Militar do
Rio de Janeiro, a técnica de meditação transcendental pode ser praticada
individualmente e em qualquer lugar, desde que sem interferências. Após uma
semana de aula com Tani, onde recebe um mantra individual, o aluno só precisa
encaixar na sua rotina 20 minutos de manhã e de tarde para meditar.
Se a preocupação é dormir enquanto medita, o professor
esclarece que a pessoa permanece consciente:
— Durante o sono, o consumo de oxigênio pelas células cai
em torno de 8%. Com a meditação transcendental, esse consumo diminui em média
60%. É um relaxamento profundo, mas a pessoa continua alerta. Esse estado
meditativo foi comprovado em 1971. É um quarto estado de consciência — explica.
A empresária Flávia Fernandes, de 48 anos, pratica a
meditação transcendental há um ano e meio. Ela conta que não deixa de praticar
um dia sequer e aponta as mudanças que a técnica trouxe para a sua vida:
— A meditação aquieta a mente. Isso melhorou a minha
tomada de decisões e a minha criatividade, principalmente no trabalho. Além
disso, meditar afasta o estresse porque estimula o bem-estar físico e mental.
PARA GERENCIAR ESTRESSE
Em Botafogo, no meio da agitada Rua Voluntários da
Pátria, a professora Bia Gaspar, da Fundação Arte de Viver, transmite calma ao
grupo de alunos que chega para a aula das 7h30min. Eles marcam presença às
segundas e quartas-feiras, em aulas com uma hora e meia de duração.
— Cada aula é diferente, mas sempre há um ganho. Nem
sempre é obviamente positivo, mas se a gente percebe que algo em nós precisa
mudar já é um ganho. Um aspecto muito importante que procuramos desenvolver é o
aumento da consciência sobre nós mesmos, sempre na direção da saúde — afirma
Bia, que há mais de dez anos trabalha com ioga e meditação em movimento.
Para a professora, o interesse crescente pela meditação é
explicado, em parte, pela divulgação e o maior conhecimento a respeito do tema,
objeto de pesquisas e diálogos, muitas vezes estimulados pelos próprios
praticantes. O estresse a níveis limítrofes também é atribuído como um dos
fatores desta procura. Nas palavras de Bia, os interessados percebem a
necessidade de buscar “recursos de sobrevivência”, e a meditação seria um
deles.
— Não dá para começar a semana xingando todo mundo e
terminar querendo férias toda semana. Tenho muitos amigos que dão aula de ioga
e meditação e o que percebemos é que cada vez mais gente está querendo se
iniciar na prática. Isso é ótimo para quebrar os estigmas e a visão
estereotipada que muitos têm, sem saber direito como funciona — comenta.
De uma forma geral, Bia Gaspar define a Fundação Arte de
Viver como um lugar que oferece cursos para “gerenciamento do estresse”. Mas
essa é a definição imediata, porque o espaço é muito mais do que isso, ela
garante.
— É um lugar com abordagem inclusiva e universalista. Não
temos qualquer tipo de restrição. Você pode ser de qualquer religião, você pode
não ter religião. Aqui é um espaço de acolhimento de diferenças e de livre
expressão dessas diferenças. Em termos práticos, os exercícios que são
ensinados são muito eficazes. É difícil a pessoa fazer alguma aula e não sentir
nenhum efeito. Eu nunca vi isso — afirma a terapeuta.
Com foco na ioga de tradição tibetana, o Instituto
Nyingma, no Humaitá, oferece programação extensa de atividades para relaxar o
corpo e a mente. Como no Arte de Viver, muitas também são gratuitas. A chamada
Kum Nye, forma de relaxamento dentro do conjunto de teorias e práticas que
ligam a medicina tibetana às medicinas indiana e chinesa, é a mais utilizada no
centro. Trata-se de um sistema de exercícios de respiração, movimentos suaves,
posturas e automassagem.
— Não existem técnicas. A prática budista é um modo de
ser, viver, olhar para a vida e para o mundo. Vivemos um tempo exacerbado, a
época da Kaliyuga (que significa muito sofrimento), então a prática da
meditação leva a um estado de mais harmonia interna e mais tranquilidade. Mas é
um treinamento. Sua mente não para, é um pensamento atrás do outro. O Kum Nye
ajuda a recuperar o fluxo de energia das sensações e dos sentimentos — diz
Roselene Costa, diretora do departamento de educação do Instituto Nyingma.
PARA TODOS OS GOSTOS
No Espaço Nirvana, na Gávea, a meditação vai além da
convencional, ministrada aos sábados, das 12h45m às 13h45m, e às terças e
quintas, das 12h30m às 13h30m. Entre as modalidades do espaço está a meditação
com taças tibetanas. A prática surgiu na cultura vedanta, na Índia, há mais de
cinco mil anos. Na técnica, a força do grupo e a condução por meio do som e das
vibrações das taças fazem o processo meditativo acontecer.
O terapeuta transpessoal Fabricio Olivares é o
responsável por conduzir a atividade. Olivares conta que a capacidade harmônica
do som e a vibração das taças possibilitam que a pessoa entre no processo de
relaxamento mesmo sem estar acostumada com isso.
— Eu toco as taças e permito esse campo vibratório. As
pessoas vão se aquietando por meio das frequências e das vibrações. Elas só
precisam respirar e relaxar enquanto isso. O poder do som faz todo o trabalho
restante — explica Olivares.
Durante a aula, os adeptos também podem encostar partes
do corpo, como os pés, nas taças tibetanas. O terapeuta explica que o ato é por
conta da vibração.
— O corpo é 75% composto por água. É como jogar uma
pedrinha no centro de um lago. Essas taças têm de 12 a 15 metais que produzem
uma vibração harmônica. Esse processo, além de remover bloqueio físico,
emocional e mental, permite que a pessoa experimente um lugar de reconexão
interior, o que é o principal objetivo desse trabalho — explica.
A musicoterapeuta Anna Haeuseler, de 29 anos, é uma das
adeptas da meditação com taças.
— Quando os materiais vibram no corpo, seja pela
ressonância ou pelo contato direto, a visão se volta para dentro. Isso remete à
nossa essência, porque dentro de nós há células que vibram o tempo todo. Além
disso, há o silenciar, que eu levei para a vida. Reduzi a minha ansiedade e me
tornei uma pessoa menos reativa — relata Anna.
A meditação guiada com taças tibetanas acontece durante
eventos esporádicos no Espaço Nirvana. Já a meditação social acaba de ser
lançada no estúdio e será realizada de 15 em 15 dias a partir de sábado. Neste
tipo de prática, o processo de mover a atenção para dentro é facilitado pela
harmonia do salão, já que é feita em grupo, com danças e dinâmicas para
facilitar o processo meditativo. Um dos idealizadores da aula, o neurologista
formado em meditação Rogerio Pfaltzgraff diz que não há contradição na relação da
meditação com a dança:
— A dança e a meditação podem soar opostas por conta da
ideia de que meditação é concentração. Mas o ato de meditar, na verdade, é não
concentrar em nada. Quando você está dançando, o seu corpo se movimenta
sozinho. Todas as experiências de se perder a sensação de que se tem um ‘‘eu’’
fazendo algo são meditativas. Então, nesse sentido, a dança também é.
O médico, que conheceu a meditação em um retiro, reitera
que os efeitos da técnica se estendem após o término da atividade.
— O descansar mental de quando meditamos faz com que haja um frescor quando voltamos a utilizar o intelectual. É a produtividade como consequência — conclui.