Anualmente, um dado econômico positivo com que o Brasil
podia sempre contar era o crescimento da receita dos hospitais particulares.
Mas a crise econômica contaminou a saúde até mesmo desse indicador. Pela
primeira vez em uma década, a receita líquida de 23 dos maiores hospitais
particulares do Brasil caiu, segundo a Associação Nacional dos Hospitais
Privados (Anahp). A queda de 1,8%, para R$ 8,3 bilhões, mostra uma reversão de
tendência depois de anos em que as instituições de saúde de ponta só ganhavam pacientes.
“O País puxou o tapete de todo mundo”, diz Francisco Balestrin, presidente da
Anahp e sócio do Hospital Vita Curitiba.
“Estamos num segmento da economia atrelado ao mercado de
trabalho, já que 90% da receita está vinculada a pacientes com planos de saúde
e poucos pagam de forma particular.” Com o aumento do desemprego no ano
passado, quase 500 mil pessoas perderam os seus planos de saúde do total de 51
milhões de brasileiros que começaram 2015 com esse benefício. Mas não só o
desemprego preocupa os hospitais de qualidade, já que muitas empresas decidiram
migrar os planos de seus funcionários para categorias inferiores, uma forma
fácil de cortar gastos, já que a saúde representa o segundo maior custo fixo
corporativo no Brasil, só atrás de salários.
Segundo pesquisa da consultoria Mercer Marsh Benefícios,
45% das empresas pretendem fazer alguma mudança em seus programas de saúde em
até um ano. Nesse cenário, para os hospitais da lista de instituições de
referência brasileiras que conseguiram escapar do destino de uma queda de
receita no ano passado, a solução foi agir rapidamente. Depois de atingir
faturamento de R$ 557 milhões em 2014, o Hospital Alemão Oswaldo Cruz percebeu
no primeiro trimestre de 2015 uma diminuição da atividade, o que levou a gestão
a acender o sinal de alerta. “Fizemos reuniões com médicos-chave, conversamos
com fornecedores e planos de saúde, para aprimorar a nossa reputação”, diz
Paulo Bastian, superintendente executivo da instituição.
“Para atrair mais clientes, criamos incentivos a médicos,
proporcionando espaço para pesquisas e programas de capacitação, além de
mostrar que oferecemos condições de trabalho excelentes e tecnologia de ponta.”
A política de bom relacionamento deu resultado e o Oswaldo Cruz deve anunciar
nos próximos dias um crescimento em torno de 12% de sua receita, no ano
passado. Como forma de antecipar problemas parecidos no começo deste ano, a
direção manteve investimentos-chave.
Em janeiro, ampliou o seu centro oncológico, uma área que
tem merecido mais atenção para poder concorrer com o Hospital Sírio-Libanês,
também de São Paulo, que hoje é considerado uma referência internacional em
tratamentos de câncer. O Oswaldo Cruz chegou até mesmo a atrair o médico Riad
Younes, que atuou por 10 anos no concorrente e que agora é o seu diretor geral
de oncologia. Outra grande aposta é uma iniciativa inovadora no mercado
brasileiro. O hospital fechou, em
dezembro, uma parceria com a Mantris, empresa de segurança ocupacional, que faz
a gestão de ambulatórios médicos corporativos.
O Oswaldo Cruz vai prestar consultoria de saúde às
empresas atendidas pela Mantris e pode destinar a elas profissionais
especializados em prevenção de doenças e nutricionistas, replicando
externamente um programa para atender seus funcionários. Essas iniciativas vão
trazer, pelo menos, 2% a mais de receita neste ano, e a expectativa é dobrar
esse incremento para 2017. Até agora, o plano tem servido para contornar a
crise. Em janeiro, o crescimento foi de 16%, em comparação com o mesmo período
de 2015. Outro hospital que conseguiu crescer em condições adversas foi
exatamente o Sírio-Libanês.
Ele tinha um agravante. Fez massivos investimentos na
ampliação da capacidade, que somaram quase R$ 1 bilhão na primeira metade dessa
década. Entre 2014 e 2015, o hospital aumentou o seu número de leitos de 358
para 452. Mas isso, em vez de causar um endividamento preocupante, serviu a
favor do hospital. “Só crescemos 17% no ano passado devido à nossa expansão de
infraestrutura”, afirma Paulo Chapchap, CEO do Sírio-Libanês. “Tínhamos
anteriormente uma grande pressão de demanda que passou a ser atendida.” Mas
essa estratégia se esgotou.
Em 2016 não haverá novas unidades de internação entrando
em operação. “Construímos estrutura o suficiente para dobrar a nossa capacidade
e chegar a mais de 600 leitos, mas faremos isso de forma gradual, por conta da
crise”, diz. O principal esforço de 2016 estará em diminuir a variedade de
materiais comprados, como forma de diminuir o impacto da inflação nos insumos
médicos importados. No ano passado, houve um incremento de 8,3% nas despesas
dos principais hospitais particulares, mas eles conseguiram repassar apenas 2%
de aumento dos preços. A solução, para não prejudicar o caixa, é ganhar
eficiência. “Para o Brasil inteiro, este momento é de cautela”, diz Chapchap.
Errata: o cargo de Paulo Chapchap é de CEO do
Hospital Sírio-Libanês e não mais superintendente, conforme publicado
anteriormente e também na versão impressa da reportagem.